Para onde estamos indo?
Nesse contexto pandêmico, qualquer um consegue identificar demandas mundiais convergentes. Quais seriam elas? O combate à Covid-19, em âmbito sanitário, e o combate à corrupção, na esfera político-social.
Ninguém, em sã consciência, consegue contrariar essas pautas, por motivos óbvios: O dinheiro público desviado para os bolsos dos corruptos impacta diretamente na falta de vacinas, na inviabilidade de aumentar a contratação de profissionais de saúde, no atendimento médico e hospitalar, na aquisição de insumos e equipamentos de proteção à vida, enfim, provoca mortes e causa danos à população. É o efeito mais direto e mais intolerável verificado de forma tão contundente e objetiva já experimentado pela sociedade contemporânea. Tudo registrado em fotos, vídeos, conteúdos, índices, minuto a minuto, em todos os cantos do mundo, nas redes sociais e mídias impressa e televisiva.
E no Brasil? Cumpre indagar com desassombro, o que nossos representantes fizeram na Câmara de Deputados na última quarta-feira, dia 16 de junho de 2021. Resolveram abrandar a Lei de Improbidade Administrativa. Isso mesmo, em vez de avançar, unir esforços para uma punição mais severa da corrupção, resolveram mitigar a lei, enfraquecê-la.
Com pesar e perplexidade, informo que os deputados, por 408 votos favoráveis e 67 contrários, aprovaram o texto-base do Projeto de Lei nº 10.887/2018, o qual propõe alterações na Lei nº 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa.
O texto aprovado pela Câmara, em vez de aperfeiçoar a Lei de Improbidade Administrativa, enfraquece gravemente o sistema de combate à corrupção, uma vez que retira da Advocacia Pública os poderes para propor ação de improbidade e o de participar dos acordos firmados com o Ministério Público.
Os equívocos são imensos. Primeiro porque a Advocacia Pública, devidamente instituída, é o órgão que detém as informações internas de atuação do ente lesado, podendo colher e aferir com verticalidade os elementos essenciais para a punição e identificação adequadas dos responsáveis.
O segundo equívoco é o fato de o texto não levar em conta o dever constitucional da Advocacia Pública de zelar pelo patrimônio público, de modo que a propositura da ação de improbidade é instrumento implícito às suas atribuições constitucionais, sob pena de retirar-lhe os meios para alcançar os fins.
É dever, ainda, da Advocacia Pública, controlar a legalidade dos atos, contratos e procedimentos administrativos, inclusive punitivos, sob cuja atuação está a tutela da probidade da atuação estatal. Assim, o aperfeiçoamento do combate à corrupção passa pela ampliação de suas atribuições. Jamais o contrário.
Em Minas Gerais, a supressão da legitimação da Advocacia-Geral do Estado nos acordos de não persecução civil será ainda mais gravosa ao interesse público, tendo em vista os expressivos resultados obtidos pela atuação conjunta da Advocacia Pública com as instituições de controle, inclusive no campo dos acordos de leniência.
No momento em que todos estão empenhados para que o combate à corrupção ocorra com eficácia e dentro do devido processo legal, causa perplexidade restringir a atuação da Advocacia Pública, formada por agentes rigorosamente selecionados por concurso público, exatamente a quem a Constituição atribuiu o dever de cuidar da legalidade e probidade dos atos estatais.
O retrocesso nesse caso é evidente. Agora é confiar que o Senado Federal reconhecerá que não há Estado Democrático de Direito sem o incansável combate à corrupção, para o qual a sociedade esteja aparelhada a contento. Daí, prescindir-se da Advocacia Pública nesse desafio resulta em privilegiar interesses inconfessáveis e trair o primordial ideal republicano, traduzido na busca do bem comum.