Entrevista com Célia Cunha – Rádio Inconfidência AM 880 – MG

Confira a entrevista da Presidente, Célia Cunha Mello, sobre o tema Paridade de Gênero.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – A Associação de Procuradores do Estado de Minas Gerais terá paridade de gênero e cotas raciais. A gente vai conversar com a defensora dessa proposta, a Célia Cunha, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de Minas Gerais. Boa tarde Célia Cunha. É um prazer recebê-la aqui no Revista da Tarde. Tudo bem?

Célia Cunha Mello – Boa tarde Débora, boa tarde aos ouvintes também. É um prazer estar aqui com vocês.

Entrevistadora Rádio Inconfidência – O prazer é nosso Doutora. Eu queria que você começasse explicando para a gente qual é a importância dessas cotas. Vamos dar um panorama, primeiro, da participação das mulheres na advocacia.

Célia Cunha Mello – Ó Débora. Se voltarmos o olhar para a composição na base da advocacia, em termos de gênero, vamos identificar que, quantitativamente, nós já alcançamos essa paridade hoje na carreira na OAB. Registrados na entidade, já temos praticamente o mesmo número de homens e mulheres, em uma situação, não exata, mas praticamente equiparada em termos quantitativos, mas quando voltamos o nosso olhar para as lideranças, né? Para os cargos de liderança, de comando, de chefia, a gente ainda identifica uma presença eminentemente masculina nesses cargos e isso evidencia essa distorção, porque não há uma representação equitativa em paridade de mulheres, e isso seria o natural principalmente pela base.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – E sua proposta, você que defende aí, né? Essa e a paridade, né? De genêro

Célia Cunha Mello – E vejo Débora, que essas necessidades de políticas afirmativas de paridade, elas são necessárias enquanto não se alcançar essa paridade, para se alcançar, para se acelerar para se corrigir essa distorção. Mas vejo que cargos de liderança podem ser ocupados, independentemente, por homens e por mulheres e que não há, nessas funções, de liderança de comando, nada que impeça as mulheres de exercer. Então essa política vem para para cumprir a ser efeito, convidar, fomentar a participação da mulher nesses cargos, exatamente para aumentar a representatividade das entidades respectivas.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – Pois é, parece assim, né? Na questão política também, as mulheres têm, né? Têm menos representação.

Célia Cunha Mello – Todos os casos, se você avaliar assim no mundo jurídico, por exemplo, os tribunais, se você avaliar todos os órgãos e a e os cargos de liderança e de comando, a gente vê que são ainda ocupados por uma minoria de mulheres. As mulheres sim, alcançaram esses cargos, já não há um impeditivo normativo que coíba a presença das mulheres, mas eu entendo que essas políticas afirmativas são exatamente necessárias para que não esperemos mais setenta ou cem anos para que alcancemos essa paridade, que é o natural, vai acontecer. A política vem exatamente para convidar, para incentivar, para fomentar a participação das mulheres. Agora, já. Porque isso vai com certeza, em todas as áreas, políticas, classistas, todas as entidades e órgãos vai ampliar a visão, vai compatibilizar uma identificação de problemas e soluções que as gestões eminentemente masculinas não alcançam.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – Você atribui ao machismo, que ainda impera em nossa sociedade, essas diferenças?

Célia Cunha Mello – Com certeza, eu falo que o machismo, além de subjugar e dificultar a vida das mulheres, faz a gente muitas vezes tolerar, aceitar e às vezes nem perceber determinadas resistências, determinadas discriminações. Não ha Débora, no mundo, na ascensão de carreiras, nenhuma entrevista que coloque para o homem questões tais como ‘o senhor é casado ou é solteiro?’, ‘o senhor pretende ter filhos nos próximos anos?’, ‘se o senhor tivesse filhos com quem vai deixá-los?’. Essa é uma atribuição que pode já ser dividida entre homens e mulheres, porque não é especificamente só afeta as mulheres, mas que por uma conveniência machista e por formação também, é, digamos assim, é o inconsciente coletivo, nosso que permite que isso aconteça ainda hoje.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – É, o machismo tá nesse inconsciente coletivo, né?

Célia Cunha Mello – Com certeza. E eu sustento também, Débora, que o machismo, além de subjulgar e dificultar a vida das mulheres, ele repercute negativamente na vida dos próprios homens. Eu digo assim, não se iludam é do alto de alguns privilégios que ainda são assegurados por essa formação, por esse pensamento machista, que permeia todos nós, reverberam ônus para os homens que os impedem de chorar, que os impedem de externar seus medos e dores, que os coloca em condições de provedores constantes, não podem ter oscilação com relação a um homem desempregado, é um drama, é um drama maior do que uma mulher desempregada, é um peso maior, o machismo é um atraso, não ajuda ninguém.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – É verdade. E coloca os próprios homens, a situação como você falou aí, né? Complicada também, né?

Célia Cunha Mello – É verdade. Eu eu acho que as políticas afirmativas cumprem esse efeito, sabe? Fazer a gente refletir coletivamente, que sociedade que a gente quer, o que nós queremos buscar com esses dificultadores que a sociedade acaba impondo às mulheres. Porque aspectos de comando, de liderança, nada tem a ver nada com gênero, tem pessoas que são mais afetas à liderar, à comandar, e tem pessoas que são menos, e também é uma escolha pessoal de cada um, mas é independente de gênero. Então o fato das mulheres chegarem a esses postos de comando de chefia, eu vejo isso com uma naturalidade inerente, como reflexo da nossa sociedade, que é paritária em termos numéricos, se a base possui o mesmo tanto de homens e de mulheres que os cargos de comando reflitam isso. É isso que eu acho que essas políticas acabam por fazer e por acelerar essa questão que a gente ainda não vê em 2022, a gente ainda não vê essa paridade. A política vem para cumprir exatamente esse efeito.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – Agora OAB e já começou a caminhar, fazer esse movimento, né? No sentindo da paridade.

Célia Cunha Mello – Sim, a OAB, essas eleições agora de 2021, foram as primeiras, e comprovem exatamente esse resultado dessa política afirmativa, porque , veja bem, a OAB foi instituída em 1930, de 1930 até hoje, nunca tivemos uma mulher na presidência da entidade Federal. Nunca, no Brasil. As conselheiras, em nível federal, o recorde que já tivemos de representantes mulheres, na OAB, no Conselho Federal, foi de 16, simultaneamente, e com a política que a OAB trouxe de paridade, a adoção de paridade no âmbito da gestão da OAB, nós já temos, agora já em 2022, 5 mulheres eleitas para as subseções. Nós tivemos a eleição de uma mulher para a subseção de São Paulo, Santa Catarina, Bahia e Mato Grosso. Ora, 5 de 27, pode parecer pouco, mas nós não tínhamos nenhuma até 2021, em 2021 não tinha nenhuma mulher na subseção da OAB, e agora nós temos 81 mulheres no Conselho da OAB, então, deu oxigenada nos quadros da OAB, deu uma fortalecida na participação feminina e ampliou, é claro, em termos democráticos, a visão da mulher. Porque as mulheres advogadas, às vezes tem problemas e tem questões específicas da sua condição feminina que não eram atendidas por uma composição eminentemente masculina. Eu menciono Débora, que nada é mais poderoso do que se colocar poder de comando nas mãos de quem já sofreu algum tipo de restrição aos seus direitos. Então, as mulheres são muito bem-vindas nesses cargos e não queremos, em temos paritários, tomar o lugar dos homens, não há nenhuma antagonismo com a gestão masculina, ao contrário, queremos somar, queremos contribuir, e é essa a ideia, sabe? A mulher não tem nenhum nenhuma luta, nenhum antagonismo com a gestão masculina, ela quer ocupar o espaço em condição paritária para que também participe da condução das carreiras, dos órgãos, nesses cargos de direção e de comando.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – Certíssimo então, Célia Cunha Mello. Então para a gente encerrar, eu queria que você deixasse uma última mensagem sobre este assunto aí para os nossos ouvintes.

Célia Cunha Mello – Só para realmente insistir que liderança e comando nada a ver tem com gênero. Outro dia me perguntaram ‘Célia nas gestões de femininas, as mulheres estão encontrando, a mulher que ascente, que chega nesses casos, ela tem encontrado quais dificuldades?’. Eu entendo que nenhuma, a mulher que tá já, hoje, nesses cargos de comando, ela já descobriu lá atrás, que comando não tem nada a ver com o gênero, e que ela pode sim, tratar e fazer o que precisa ser feito independentemente do sexo, e que as lideranças das mulheres que hoje ocupam esses cargos estão aí para nos provar, que temos gestões exitosas, mais plurais, criativas, inovadoras e que entregam resultados. Isso é o que mais importa. Nós temos que descobrir, Débora, como fazer um mundo mais justo, um mundo melhor. Essa é a pauta, essa deveria ser a pauta, e não pauta de acesso, se mulher pode ou não pode, isso não importa, quem vai estar no cargo de comando, tem que ter lá uma pessoa que queira estar lá, que se dedique e que principalmente brigue por uma melhora social.

Débora (entrevistadora da Rádio Inconfidência) – Ok. Muito obrigada, então, Doutora Célia Cunha Melo, que é presidente da Associação dos Procuradores do Estado de Minas Gerais, APEMINAS, foi um prazer recebê-la, viu muito obrigado.

Célia Cunha Mello – Prazer é meu. Eu cumprimento todos os ouvintes e agradeço o contato, viu? Uma boa tarde a todos.

*A entrevista foi concedida à Rádio Inconfidência, publicada em 28/03/2022 e pode ser acessada na íntegra pelo link: Entrevista com Celia Cunha (ideiafixa.com.br)

Compartilhe esse conteúdo